quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

ETANOL: PROPAGANDA ENGANOSA

A política de incentivo ao uso de etanol nos convida novamente ao picadeiro. Como se não bastassem os assaltos constantes ao nosso dinheiro, a gasolina será mais vantajosa que o álcool por alguns meses para a decepção dos portadores de carros bicombustíveis (flex). A propaganda a favor da substituição dos tanques de combustíveis foi ostensiva anos atrás. Hoje nem todos os brasileiros temos paciência para fazer o cálculo dos 70% antes de abastecer. Fomos enganados.

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento culpou o excesso de chuvas no período de colheita de cana-de-açúcar, que inibiu o corte de mais de 60 milhões de toneladas. A mesma instituição pública federal previu que o mercado de etanol se normalizaria em até 120 dias. Está na moda culpar as chuvas pela incompetência humana no Brasil. Foi assim no apagão de novembro de 2009, que, para mim, não passou de uma conspiração. Evento mal explicado.

Ainda que a produtividade tenha aumentado na transformação de cana-de-açúcar em etanol devido aos avanços tecnológicos, o preço se define pelo mercado internacional. Vale apontar que 2/3 do etanol brasileiro é exportado porque convém à lucratividade da indústria de álcool. Portanto, o argumento das chuvas é pífio. Explico: o álcool não teria faltado aos brasileiros pela colheita menor de cana-de-açúcar se não houvesse sido mandado ao exterior pelo atrativo deste mercado.

Para os produtores, o raciocínio é simples: em vez de produzir dez litros por um real, poderão vender cinco litros pelo mesmo preço final se o lucro for maior.

Se o Brasil tivesse uma política de segurança energética, assim como os Estados Unidos elaboraram a sua para proteger o consumidor estadunidense, o etanol seria um produto barato para o consumo interno e o brasileiro teria prioridade na compra. A servilidade do governo tupiniquim aos latifundiários e o mercado internacional relega-nos a fazer preces para que o preço do etanol baixe ou para que chova menos no próximo verão.

O dessangramento do consumidor brasileiro não pára aí. Com a redução da safra de cana-de-açúcar da Índia, que é um dos maiores produtores mundiais, o Brasil tende a abastecer o aumento de demanda internacional em detrimento do consumo interno. Ainda, fala-se do risco de as usinas substituírem a produção de etanol pela de açúcar devido à alta do preço internacional do segundo produto. Logo se anunciou a política que reduz provisoriamente de 25% a 20% a percentagem de álcool na gasolina a partir de fevereiro. O mercado define se o brasileiro estará satisfeito ou não.

Resumindo: somos imensamente roubados neste país! Por isso que há dois Brasis: um dos tolos e outro dos instruídos. A complacência dos tolos inibe a insatisfação dos instruídos. O resultado da equação é a injustiça com a nação. Aos poucos, a seriedade cede espaço ao circo e a instrução vira motivo de zombaria. Qualquer brasileiro nesta situação colheu a mofa antes do respeito.

Energia é uma questão estratégica em qualquer país. O Estado tem a obrigação de zelar por ela. Em vez disso, o júbilo pela descoberta de petróleo na camada pré-sal contraria o discurso oficial de aumentar o uso de energia limpa no Brasil. Quando o país tem a chance de ser o exemplo mundial com o uso de etanol e biodíesel, sofre a recaída em modelos de apropriação de petróleo.

Propaganda enganosa ou reflexos de um país que não sabe aonde quer chegar?

Bruno Peron é latino-americanista.

Colaboração de Bruno Peron para o EcoDebate, 14/01/2010

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