sexta-feira, 22 de maio de 2009

AGRONEGÓCIO X AGRICULTURA FAMILIAR: MODELOS EM CHOQUE

Vivemos numa época da história que nos obriga a abordar a temática da terra e da reforma agrária no contexto de agressões cada vez mais violentas ao meio ambiente, aos ecossistemas e à própria vida.

O que encontramos normalmente nos marketings empresariais e governamentais é a maquiagem da destruição com o conceito falacioso de sustentabilidade e de desenvolvimento sustentável. O que se teoriza é a compatibilidade da modernização ecológica ou da economicidade da ecologia.

Os Estados, como “balconistas” do capitalismo transnacional apoiam o atual modelo de desenvolvimento, maquiando, junto com as grandes empresas, a agressão à terra e aos povos da terra, utilizando, cínica e equivocadamente, o tema da sustentabilidade.

Atualmente, o planeta dispõe para a agricultura apenas 1,4 bilhão de hectares de terra, quase todas localizadas no nosso continente.

Um quarto dessas áreas, cerca de 360 milhões de hectares está no Brasil. Por isto, temos o papel de uma Arábia Saudita verde.

É importante não esquecer, além da questão da utilização do solo em função agro-exportadora, a exploração do subsolo pelas empresas petrolíferas e mineradoras. Juntas garantem os lucros maiores e as estatísticas positivas do PIB do Brasil.

No Brasil, o agronegócio é apresentado pelo governo como compatível com a preservação do meio-ambiente. O Governo Lula casou com o modelo econômico hegemônico, dando continuidade ao projeto “modernizante”, que mal disfarça a submissão e o colonialismo de sempre. Este modelo atende apenas a 10% da população – ricos e parte da classe média – e enfrenta os graves problemas da maioria dos brasileiros com a esmola das políticas compensatórias.

O latifúndio dos monocultivos e da pecuária é privilegiado à revelia da legislação ambiental e dos mais elementares direitos dos nossos povos tradicionais – indígenas, quilombolas, ribeirinhos, camponeses das múltiplas territorialidades e economias – que pagam o preço da desterritorialização e da marginalização. A ideologia neodesenvolvimentista do atual governo, alicerçada no PAC, na produção de cana-de-açúcar, soja, eucalipto e temperada pelo mito da sustentabilidade dos agrocombustíveis, desconsidera, com uma miopia inaceitável, o que a maioria dos cientistas afirma sobre os riscos não remotos de acabar com a vida na terra.

Percebe-se, além disto, a estreita ligação entre agronegócio e hidronegócio, não somente pelos aspectos de destruição ou privatização das águas do país, mas, também, pela tendência ao controle total da água doce, considerada como mais uma mercadoria e não um bem público, um direito humano e direito de todos os seres vivos. Acrescente-se que os monocultivos são responsáveis por novas ondas migratórias, que envolvem o assalariamento de milhares de camponeses, envolvidos em trabalho escravo, trabalho superexplorado e trabalho infantil.

Enfim, é necessário atentar aos dados publicados, anualmente, pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Conflitos no Campo Brasil, que mostram como a violência fica cada vez mais concentrada nas regiões de expansão do agronegócio.

Em suma, o governo federal abandonou teórica e politicamente o tema e o compromisso da Reforma Agrária. Assistimos à ausência programática de uma proposta de desenvolvimento rural a partir dos camponeses e das camponesas, cuja economia familiar é considerada inviável técnica e economicamente.

É a partir destas situações emergenciais e dramaticamente urgentes que somos obrigados a reconstruir uma visão crítica do atual sistema e a propor novos paradigmas de relações econômicas, ecológicas e políticas. E um novo paradigma de Reforma Agrária, que supere uma visão meramente agrarista e distributivista e que contemple a variedade étnica e territorial do campesinato brasileiro.

É a partir destas situações que a CPT apoia a resistência e a luta camponesa em defesa de territórios e economias, no enfrentamento do latifúndio e do hidro-agronegócio, contra a “Reforma Agrária de Mercado”, que com o Crédito Fundiário submete as lutas camponesas ao controle do agronegócio.

Hoje, as organizações camponesas enfrentam adversários, que articulam setores expressivos do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, elites tradicionalmente hostis à reforma agrária e que visam judicializar e criminalizar os movimentos e os defensores dos direitos humanos. Diante disto, a CPT apoia toda forma de organização e articulação que possa garantir o protagonismo político dos povos do campo e da floresta e a defesa da vida.

Por: Padre Flávio Lazzarin

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